domingo, 30 de janeiro de 2011

Universitário relata cenário de destruição na capital egípcia


“Lei marcial”. Assim, George, um universitário texano de 29 anos, há 30 dias no Egito, descreveu o que encontrou em frente à estação de trem Ramsés, no Cairo, quando chegou, às 3h deste sábado (29). Com essas duas palavras, ele resumiu um cenário de destruição: pedras e estilhaços espalhados pelo chão, carros queimados na entrada de três das ruas que convergem na praça em frente à estação, 12 tanques de guerra, alguns estacionados e outros movendo barricadas de concreto.

Até esta sexta-feira, dia 28 de janeiro, o Cairo era uma cidade que parecia não dormir, onde, mesmo de madrugada, se viam lojas abertas, famílias – mulheres completamente cobertas com véu, inclusive, arrastando as crianças – e um número excessivo de carros buzinando e atravessando os cruzamentos, onde os semáforos sempre piscavam a cor amarela de “atenção”.

“Daqui a alguns anos, quando voltarmos ao Cairo, vamos encontrar um ponte chamada 28 de janeiro sobre o rio Nilo”, brincou George, tentando esconder a preocupação, sobre uma cidade que tem pontes alusivas a datas de outras revoluções, como 26 de julho ou 6 de outubro.

No dia anterior, ele havia pegado um dos trens que saem de hora em hora para Alexandria, a segunda maior cidade do país, depois de tomar um café e se despedir de amigos, suíços, alemães, brasileiros, no saguão de um hotel no bairro de Zamalek, uma ilha do Nilo, no coração da capital. Pagou 15 libras egípcias, menos de 5 reais, do hotel à estação de trem. Na madrugada de sexta, porém, ele saiu pelas ruas acenando notas no valor de 400 libras – mais de 100 reais – para tentar convencer alguém a levá-lo de volta ao hotel. Ficou mais de uma hora, perambulando pelas ruas, até encontrar alguém.

Sem polícia

No que parecem as últimas tentativas do presidente Hosni Mubarak, 82 anos, 30 deles à frente do governo egípcio, de controlar o caos que só explodiu nesta sexta – apesar das primeiras manifestações terem começado na terça-feira, 25, feriado nacional do Dia da Polícia –, um toque de recolher foi decretado durante toda a madrugada de sexta para sábado e a partir das 16 horas deste dia. A partir daí, tanto o Cairo quanto Alexandria parecem territórios controlados pelos manifestantes. A polícia, antes onipresente, sumiu das ruas. Apenas em frente a prédios públicos, como a estação Ramsés ou o Museu Egípcio, blindados e soldados do exército montam guarda à espera de uma tentativa de invasão.

O chamado dos muezins para as cinco orações diárias continua sendo ouvido, mas as portas das mesquitas estão fechadas. Nas ruas, apenas adolescentes e jovens perambulam, com bastões feitos de paus e pregos, nas mãos. A população apenas ouve e reza, trancada em casa. Alguns, com medo da ameaça militar de “atirar em qualquer pessoa suspeita que desobedeça ao toque de recolher”, como anunciado pelas rádios do país. Outros, com medo de uma violência inédita, com a cidade à mercê de saques.

Saques

Um supermercado, muitas lojas e alguns apartamentos foram saqueados durante o fim de semana, que, nos países islâmicos, é composto pela sexta-feira e pelo sábado. Apontando para um viaduto outrora que liga o bairro de classe média de Mohandseen ao bairro pobre de Embaba, no Cairo, um taxista perguntou: “Você vê aqueles meninos ali? Tudo bandido”, ele mesmo respondeu, sobre um grupo de homens que brigava entre si com pedaços de pau e atirava pedras sobre os carros parados embaixo do viaduto, durante a madrugada. No caminho de volta ao hotel, George também relatou ter visto jovens carregando móveis e aparelhos eletrônicos pelas ruas.

A impressão que se tem ao se andar pelas ruas e conversar com as pessoas sobre esse Egito “revolucionário” é a de que muitos estão se aproveitando das manifestações políticas para promover atos de vandalismo. O Museu Egípcio, que abriga a maior coleção de múmias faraônicas do país as peças mais importantes do túmulo de Tutancâmon foi invadido, enquanto manifestantes incendiavam o prédio ao lado, sede do Partido Nacional Democrático, de Mubarak.


Fonte:G1

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